Sistema Processual Penal

Em 1808, o Código Napoleônico estabeleceu duas fases no sistema, uma inquisitória (pré-processual) e outra acusatória (processual) com separação nas funções de investigar, acusar e julgar. Com a Constituição Brasileira de 1988 a doutrina passou a defender que o nosso sistema processual vigente seria o acusatório, pois nossa Carta Magna implicitamente estabeleceu a separação nas funções de investigar, acusar e julgar. Alguns, porém passaram a defender que o nosso sistema processual tinha a característica de misto.

Partindo de uma visão Kantiana é preciso dizer que para existir verdadeiramente um sistema, devemos partir do pressuposto da sua ideia fundante e seu princípio unificador. Sendo assim, é obvio que seria impossível unificar elementos que se encontram em fases completamente separadas e tão antagônicas entre si. Com a devida vênia, a quem pensa diferente, há um enorme equívoco quando se afirma que o sistema processual brasileiro pode ser misto, sobretudo, porque a ideia de sistema traz consigo a pureza de seu instituto.

No direito, sobram explicações como sistemas “sui generis”, híbridos ou mistos, que na verdade não explicam absolutamente nada, despontando perigosamente uma mentalidade de discurso emotivo convenientemente adotado muito mais para confundir do que esclarecer. É comum no processo penal, ouvir que tudo aquilo que me agrada, seja por qualquer razão, faz parte do sistema acusatório, tendo um slogan garantista e positivo.

Por outro lado, tudo aquilo que não me interessa, seja porque de fato, tecnicamente não me é conveniente, ou por qualquer outra razão inconfessável, seria inquisitório. Acho que aqui está o ponto, eis que essas indagações provocam a percepção de que o rótulo acusatório no processo penal soaria como algo capaz de servir aos interesses da democracia, e contrário a isso, o rótulo inquisitório, não serviria aos anseios processuais num ambiente democrático. Por sua vez, o misto, seria uma junção dos dois sistemas que poderiam conviver pacificamente no processo.

O certo é que inegavelmente esses são apenas elementos do sistema e quem opta por eles numa perspectiva democrática, é o Estado. Esclareço. Cite-se, por exemplo, o tema trazido já algum tempo do Ministério Público poder investigar em procedimento próprio. Qual o sistema nesse caso? Acusatório? Inquisitório? Ambos?

Se não gosto da ideia de que o Ministério Público investigue, simplesmente o chamo de inquisitório e advirto que a mesma pessoa que investigue, acuse. Alego que não seria razoável que o Ministério Público possa ao mesmo tempo produzir um elemento de prova que sirva de base para ele mesmo se utilizar na acusação. Posso, inclusive por argumentos históricos, lembrar que o Ministério Público como instituição nasceu no século XIV na época do Rei Felipe “o Belo” e foi criado especificamente para proteger os interesses do Rei, tendo sua ascensão na fase mais aguda inquisitória da Europa continental, ou seja, a própria presença do Ministério Público no processo já seria por si só, inquisitória.

De outra sorte, e com argumento totalmente contrário, se fosse interessante que o Ministério Público realizasse uma investigação em procedimento próprio, eu enalteceria o sistema acusatório, buscando da mesma forma argumentos para justificar essa posição. Revelaria que quando se fala em sistema acusatório, o objetivo não é a investigação e sim, a gestão da prova e o que é vedado por esse sistema não é investigar e acusar e sim acusar e julgar, porque não é conveniente quem julga, seja o mesmo que acuse.

O que importa mesmo no sistema é quem vai gerir a prova e a definição dos sistemas não passa somente pela separação dos atores jurídicos e suas funções de investigar, acusar e julgar, ela é mais do que isso, passa necessariamente pela gestão da prova. Ela é o norte que irá guiar o resultado útil do processo.

Nos sistemas mais modernos, as partes tem o poder de gestão sobre a prova e é nesse sentido que as coisas devem andar. O processo penal não pode se prestar a esse papel com discursos dicotômicos que só servem para confundir. Ainda que se possa manter a dicotomia (inquisitória e acusatória), admitindo-se que ela, de alguma forma, contribua para se construir um processo penal mais garantista a luz do que espelha a nossa constituição, precisamos sem demora defini-la. Enfim, com a palavra a nova lei 13.964/19.

CONTATO

Email: moisesrosa@adv.oabsp.org.br
Tel: (35) 3646-0013
Rua São Pedro, 322, Jd Primavera Pouso Alegre-MG

OAB

MG: 178.788

SP: 167.830

Desenvolvido por

Rolar para cima