Interrogatório Judicial: Estratégia ou Medo

Houve um tempo no processo penal em que o interrogatório na fase judicial era o primeiro ato de uma audiência criminal, presentes apenas o réu e o Juiz, ou seja, o advogado de defesa, bem como o fiscal da lei (Promotor de Justiça) eram figuras dispensáveis, sendo este ato exclusivo da autoridade judicial. Amilton Bueno de Carvalho, Lênio Streck à época, Procurador de Justiça no Rio Grande do Sul, tiveram a iniciativa primeva de anular todos os julgamentos que eram produzidos dessa forma.

A tese era de que o interrogatório era um meio de defesa e havia a necessidade do acusado possuir um advogado para que ela pudesse ser ampla. Isso ainda não constava na lei que apenas avançou após 2008 e hoje diante da Constituição Federal e de nova legislação sobre o tema, o interrogatório passou a ser o último ato da instrução processual antes da autoridade judicial proferir a sentença.

Todavia, mesmo com todas essas mudanças, ainda remanesce uma mentalidade inquisitória e quase que ingênua por parte de quem preside a audiência de instrução e julgamento. Alguns profissionais se sentem ofendidos frequentemente e passam a tomar decisões completamente ilegais e abusivas, quando o acusado se recusa a responder as perguntas do Ministério Público e da própria autoridade Judicial, querendo apenas responder as perguntas de seu defensor, direito esse garantido constitucionalmente e sem reservas de lei.

Registro que, é bem verdade que uma estratégia como essa nem sempre é a melhor saída para quem está sendo acusado de um crime e está diante de um Juiz ou na presença de sete jurados no Plenário do Júri, querendo ouvir a versão dos fatos do próprio acusado e que de alguma maneira possa ele refutar essas acusações ou até mesmo, mostrar que os fatos não se deram da forma em que a acusação lhe imputa.

Para muitos leigos essa atitude de falar seria quase que um ônus para o acusado, pois na vida, a máxima do “quem cala consente” está em todos os rótulos e pré-julgamento vivenciados no nosso cotidiano. Ela opera silenciosamente dentro de uma narrativa que cabe no entendimento simplório racional da maioria das pessoas. Para muitos, é preciso falar, dizer, gritar, reclamar, se indignar com uma injustiça que está sendo cometida contra nós. Se você silencia ou quer apresentar apenas a sua versão, pela lógica inquisitiva, ao menos para alguns, não há crédito em suas palavras.

Mas no processo penal, as coisas não podem ser analisadas sob esse prisma ingênuo, reducionista e quase infantil, principalmente, levando-se em conta as características pessoais do acusado e o tipo de crime que foi cometido. Há um infinito de proposições e possibilidades e cada caso é um caso que arrasta milhões de alternativas com ele, dentre elas, a possibilidade de envolvimento de pessoas que nada tem a ver com o delito, mas que certamente, serão arrastadas para dentro dele, mormente, quando a confissão pode gerar mortes de parentes e familiares.

Nessas situações, o silêncio não deve ser interpretado como uma recusa em não ser incriminado principalmente pelos profissionais que atuam na área do Direito. Seria muita ingenuidade acreditar que advogados e defensores públicos experientes, decidam orientar seus clientes que não respondam as perguntas das autoridades se isso certamente irá prejudicá-los na avaliação da estratégia de seu silêncio, quando do oferecimento de memorias finais pelo Ministério Público ou até mesmo na prolação de uma sentença, mesmo que esteja na lei que esse pressuposto não deva ser levado em conta. Porque faríamos isso? Sabemos que essa decisão tem peso e se isso foi requerido por um acusado, as autoridades devem sopesar que essas premissas foram exaustivamente avaliadas. Uma palavra bendita pode beneficiá-lo, de outra sorte, uma palavra maldita pode custar, além da sua liberdade, a sua própria vida e a de outras pessoas.

É preciso uma mente muito desfocada do seu tempo para querer tirar a qualquer custo do acusado uma verdade que por vezes nem ele sabe ou pode trazer a tona. Interrogatório é apenas uma versão que pode ser levada em consideração ou não pela autoridade judicial. Após o ato, todas as partes, Defensores, Juízes e Promotores retornam aos seus lares imbuídos de que fizeram o seu melhor para a comunidade e a suas vidas continuam. Do lado de cá, a história é outra. Na vida e na Justiça, sensibilidade é tudo.

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